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Astrofísico lamenta "máquina" de fazer cientistas sem carreira

Astrofísico lamenta "máquina" de fazer cientistas sem carreira

“É difícil, muito difícil”, disse em entrevista à Lusa o investigador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA) quando questionado sobre como é ser cientista em Portugal.

Segundo Pedro Machado, 55 anos, “há um investimento enorme” na formação, mas depois “não há estabilidade, uma carreira científica bem estruturada”, apesar de Portugal ser um país onde “a máquina de fazer doutorados é excelente”.

“Produzimos doutorados excelentes”, frisou o astrofísico, que ocupa uma “posição permanente” como professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que “foi uma luta”, mas que “até há muito pouco tempo”, e “durante décadas”, viveu de bolsas de pós-doutoramento e contratos de trabalho a termo associados a projetos científicos com os quais concorria a financiamento “sem saber o dia de amanhã”.

Apesar das dificuldades, Pedro Machado, que hoje dá nome a um asteroide descoberto em 2001 que orbita o Sol entre os planetas Marte e Júpiter, optou por ficar em Portugal, porque entende que “só se consegue ajudar na mudança ficando”.

Além de dar aulas, orientar alunos de mestrado e doutoramento e fazer ciência, o astrofísico comunica a ciência que faz nas escolas, onde dá palestras.

Pedro Machado é especialista no estudo de atmosferas planetárias, mas o seu trabalho, menos conhecido mas igualmente publicado, sobre a deteção e caracterização de asteroides e das suas “quase atmosferas”, as exosferas, valeu-lhe o reconhecimento da União Astronómica Internacional (UAI), que passou a designar o asteroide “2001 QL160” como asteroide “32599 Pedromachado”. A decisão foi conhecida na quinta-feira.

O investigador acolheu-a com “grande surpresa” e esteve “quase a desligar o telefone”, tal a incredulidade, quando a UAI lhe verbalizou a notícia de que o seu nome iria “brilhar nos céus”, no caso sob a forma de um ‘calhau’ com quase três quilómetros de diâmetro e que demora cerca de quatro anos e meio a dar uma volta ao Sol.

Comentou para si, a brincar, que passaria a pagar um IMI (Imposto Municipal sobre Imóveis) espacial, mas, na verdade, não pode deixar de agradecer “o ato de amor” dos amigos e colegas de várias partes do mundo que lhe “fizeram uma partida” e propuseram o seu nome à UAI, entidade com competência para nomear corpos celestes.

Agora, Pedro Machado empresta o seu nome a um asteroide que não observou nem descobriu. Quando “a investigação científica é uma luta contínua”, cai-lhe bem saber que acabou um dia de trabalho “com uma luzinha a brilhar no céu”. Um asteroide, ao contrário de uma estrela, não emite luz, mas reflete a luz de uma estrela, no caso o Sol.

Natural da ilha de São Miguel, apesar de se afirmar açoriano de todas as ilhas, o investigador já viajou para paragens mais longínquas, como o Havai, nos Estados Unidos, onde foi “o primeiro a ver” com o auxílio de um telescópio um furacão em Vénus, até então só previsto em modelos.

Define-se como astrónomo e astrofísico, porque os dois andam lado a lado. Observa o céu com telescópios, deteta o que há nele e estuda a física que está por detrás.

Nem tudo é romântico, há todo um “trabalho nada fotogénico” e “de secretária” a fazer, que ocupa grande parte do tempo, como estar sentando em frente a um computador a analisar os dados de observação que tiveram de ser previamente codificados para serem “lidos”.

Muitas vezes, um projeto científico “feito de sonhos” tem de ter “tijolos de realidade”, acentua Pedro Machado.

A sua realidade como astrofísico e astrónomo começou a desenhar-se aos 11 anos quando comprou um livro sobre o Sistema Solar, que ainda conserva, com o dinheiro poupado num porquinho-mealheiro. Intrigava-o já na altura a vida, o Universo. De caixotes fez naves espaciais.

Doutorado em Astronomia e Astrofísica pela Universidade de Lisboa e pelo Observatório de Paris, Pedro Machado continua a questionar-se como se formou a vida. “Não entendo, são tantas variáveis”, sublinha.

Procura no seu trabalho “aproximar-se da verdade da simplicidade do Universo”, onde, apesar das muitas incógnitas que ainda persistem, “há espaço para todos”, não havendo necessidade de “lutas mesquinhas”.

Os caixotes da infância deram lugar a outras construções, mais recentemente a estudos e projetos sobre, nomeadamente, as atmosferas de planetas fora do Sistema Solar, as tempestades em Marte e Júpiter, as luas geladas Europa, Encélado e Titã.

Aparte isso, pretende na sua missão como cientista “contribuir para que todos percebam melhor quão frágil é a Terra”.

“É preciso olhar para o céu para compreendermos melhor o planeta”, sustentou.

Para Pedro Machado, “se se aprender a lição e entrar em sintonia” com a Terra, no sentido de preservá-la, talvez a tecnologia usada na exploração espacial para ajudar a cuidar do planeta permita a descoberta de um planeta parecido com a Terra onde a humanidade possa “viver um dia”.

No Universo, que sempre o fascinou desde criança, o astrofísico junta-se a Nuno Peixinho e a Pedro Lacerda, também astrofísicos do IA com o nome “perpetuado” em asteroides.

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Fonte : Notícias ao Minuto – Tech  

11 Julho 2023

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